Crypta comanda noite apocalíptica no Hell de Janeiro

A cena heavy metal carioca está viva! E como é bom fazer tal declaração, visto que há tempos a Cidade Maravilhosa tem recebido a injusta pecha de volume morto do panorama nacional. A prova cabal para esta afirmação é o sucesso do mini festival que rolou nesta sexta-feira, dia 3 de novembro, na icônica casa de show da capital fluminense, Circo Voador, que trouxe quatro shows bombásticos: Crypta, Surra, Dark Tower e Klitoria.

Sexta-feira já é, como de costume, um dia com trânsito conturbado, caótico, com os ânimos das pessoas ainda mais exaltados e a paciência quase funcionando na reserva; adiciona ao combo intenso calor e muita, muita chuva, pois, a atmosfera da cidade acaba, invariavelmente, ganhando contornos infernais. Portanto, para expurgar e depurar toda esta energia nociva, um, dois, três… shows de metal são a melhor pedida para todo mundo ir para casa com o espírito livre, leve e solto, quase como um monge budista.

Klitoria fora a responsável por começar os trabalhos da noite; a banda é novata no cenário underground carioca, formada em 2022, com apenas um EP e um full-length, contudo, nem por isso se intimidaram por ser a caçula do lineup, pois chegou com tudo e apresentando todo poderio sonoro de seu punk rock. O show foi relativamente curto, mas causou boa impressão à plateia que não cansou de bradar o nome do quarteto.

Rápida troca de equipamento, Dark Tower abriu as compotas das trevas ao som de seu pesado e impiedoso repertório, que reza essencialmente na cartilha do death metal, mas salpica elementos de black metal sem parcimônia alguma, o que torna sua obra musical ainda mais atraente ao ouvinte.

O baixista e líder do grupo, Rodolfo Ferreira, fora o mestre de cerimônia da festa do DT, e também ajudou orquestrar o mantra da noite: ‘ei, Bolsonaro, vai tomar cú’. Foi uma doçura testemunhar mais de mil vozes bradando tal carinho ao ex-governante do país.

O quê anárquico da noite, com direito a um bocado de fã tomando de assalto o microfone, veio com a porradaria sonora perpetrada pelo Surra! Stage diving e mosh pits foram os motes da apresentação dos caras, que mescla, com singular maestria, nuances de thrash metal e punk rock, dando às músicas aquele bem-vindo caráter de ser a melhor ferramenta para infernizar os vizinhos e os familiares que têm aversão a qualquer riff de guitarra e ou blast beat.

O céu é o limite para o Surra, isto posto, o trio é uma banda que tem tudo para crescer, dentro de seu nicho de atuação, evidentemente, e se transformar em um dos maiores nomes do som pesado tupiniquim. Para o alto e avante, Surra!

Crypta, a headliner da noite, chegou cheia de pompa, com palco relativamente simples, mas ornamentado de acordo com o teor lírico e musical de seu mais recente registro de estúdio, Shades of Sorrow, lançado em agosto deste ano via Napalm Records.

E por falar em Shades of Sorrow, o quarteto, que é formado Fernanda Lira (vocal e baixo), Jéssica Di Falchi (guitarra), Tainá Bergamaschi (guitarra) e Luana Dametto (bateria), desfilou pedradas do disco como The Outsider, Trial of Traitors, Lord of Ruins e Poisonous Apathy, além de From the Ashes, Kali, Dark Night of the Soul e Under the Black Wings, que estão no debute Echoes of the Soul, de 2021.

Não é à toa que Fernanda e companhia têm conquistado bons resultados para a Crypta e para a cena extrema brasileira, pois o show das moças está afiado; redondo, como dizem por aí. Lira é uma frontwoman nata, goza de muito carisma; além disso, a cada fase da banda, a cada dia e apresentação que passa, tem lhe agregado mais e mais experiência, o que a proporciona cada vez mais controle da plateia e do espetáculo.

Di Falchi e Bergamaschi é a dupla perfeita para segurar as seis cordas do grupo: a primeira possui uma pegada mais metal tradicional e melódica, já a segunda é da escola extrema, sem tirar nem pôr. Arpejos e sweeps velozes, palhetadas alternadas com salto de cordas, alavancadas e muita personalidade estão no arsenal das belas guitarristas, que aplicam tais artifícios com pura maestria e capricho. Dametto também não deixa por menos e comanda seu kit de bateria sem piedade alguma, usando e abusando de blast beats e bumbos duplos.

Foto: Livia Teles

Já passava de uma hora da madrugada quando o último acorde da noite fora tocado, e como foi bom ver o público voltar para casa cansado de tanto curtir, ‘bangear’, pular e gritar os versos das dezenas de músicas tocadas no lendário Circo Voador. E como foi ótimo também constatar mais uma vez que a cena metal do nosso amado/odiado Hell de Janeiro está viva, pujante e cheia de energia.

Desejamos que mais eventos como este possam ganhar mais edições e com ainda mais público. Vida longa à Crypta, Surra, Dark Tower e Klitoria; e só para não esquecermos aquele nosso maroto mantra: ‘ei, Bolsonaro, vai tomar cú’.

Foto: Livia Teles

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