Summer Breeze Brasil: 1º dia é marcado por shows memoráveis e erros primários de produção

Há vinte e cinco anos nascia o festival alemão Summer Breeze, com intuito de ser mais uma boa opção de entretenimento ao concorrido mercado germânico e, claro, engrossar a vasta lista de eventos dedicados ao rock e metal na Europa. O sucesso do festival em terras estrangeiras é tamanho que um estender de fronteiras se tornou um movimento natural e óbvio. E o local escolhido para tal empreendimento fora o nosso querido Brasil, que está recebendo o festival neste final de semana, com um line-up recheado de atrações para todos os gostos da música pesada.

Seja representado pelo thrash metal classudo do Testament, Kreator e Sepultura; pela velocidade e pompa do power metal do Blind Guardian, Stratovarius e Avantasia; pela festa hard rock oferecida pelo H.E.A.T. e Skid Row; pelo metal tradicional e puro sangue do Accept e Grave Digger ou pela maravilhosa desgraceira sonora do Lamb of God, Krisiun e Napalm Death. Em suma, a primeira edição do Summer Breeze Brasil tem sons para todos os gostos e seu pontapé inicial veio encorpado com shows memoráveis.

Fora dos três principais palcos: Sun, Hot e Ice, o circuito cultural e artístico foi garantido por feira geek, com tendas voltadas a jogos de RPG e filmes de terror; comércio de vinil, CD, camiseta e colecionáveis da cultura pop como Funko; feira de tatuagem; estandes de marcas consagradas do setor musical como Ibanez, entre inúmeras outras opções de entretenimento.

O campo musical, obviamente, é o carro chefe e começou bem cedinho com o Voodoo Kiss; banda do baterista Achim Ostertag, que é o criador do Summer Breeze Festival. O grupo defendeu as canções de seu álbum autointitulado, lançado no ano passado, no entanto, ficou óbvio que só foi convidado para o jogo porque o líder é um dos donos da bola. Logo após o último acorde no Hot Stage, o Ice Stage estreou com o death metal do Benediction, que deixou o público com o primeiro zumbido no ouvido do dia, visto tamanha brutalidade de seu set.

O vocalista João Gordo comandou os trabalhos do Brutal Brega, que é um tributo à música brega, o qual transforma clássicos da música brasileira em versões punk rock. O show foi interessante e divertido, mas careceu de mais prestígio do público. Contudo, é válido um desconto, pois o público ainda estava chegando ao local da festa.

Foto: MH ARTS

Marc Martel é o cantor que ostenta uma impressionante similaridade vocal com o astro do rock, Freddie Mercury. O espetáculo de Marc e sua turma foi bacana, pois o repertório fora cunhado por clássicos do Queen como Tie Your Mother Down, Under Pressure, Stone Cold Crazy, We Will Rock You, entre outros.

Porém, a incômoda sensação de estar comendo bala com papel sempre paira no ar em suas apresentações, já que seu show é edificado único e exclusivamente por covers. Um passo ao repertório autoral; em equilíbrio a alguns covers, seria mais digno do que se basear em obras de terceiro para caminhar no circuito profissional e de bandas autorais. Ao contrário do Brutal Brega, que é uma tiração de sarro, “show sério de banda cover” é para boteco de fim de semana e não para grandes festivais.

O combo com Shaman, Viper e convidados homenagearam o incrível e saudoso Andre Matos. No repertório, sons incríveis de toda carreira do cantor como Lisbon, Make Believe, For Tomorrow, Living for the Night, Fairy Tale e Carry on. O tributo ao vocalista, que valeu cada segundo da atenção do público, aconteceu minutos depois da estreia exclusiva do segundo episódio do documentário Maestro do Rock no Waves Stage.

Nunca foi segredo a ninguém que Matos era uma pessoa sensível – e não leve esse predicado para o lado pejorativo ou jocoso, por favor – centrada e introspectiva, todavia, no palco, se transformava em um dos maiores vocalistas, músicos e frontmen do mundo. Testemunhar relatos e declarações de familiares de Matos como mãe, irmão e irmã foi emocionante e provou, mais uma vez, o quão especial o cantor era dentro e fora dos palcos.

No começo da tarde no Sun Stage, a Crypta fez o seu habitual show, com as medonhas caras e bocas da vocalista Fernanda Lira e o trabalho duro ficando na responsabilidade das guitarristas Tainá Bergamaschi e Jéssica di Falchi e baterista Luana Dametto. Crypta é uma banda nova que carece de mais burilamento musical, mas vislumbra grandes perspectivas, caso mova as peças do tabuleiro de forma inteligente. Por enquanto, o espetáculo não é quente, tampouco frio; se encontra apenas num limbo.

A morte do Skid Row aconteceu em meados dos anos 1990, quando aconteceu a saída do vocalista e rockstar Sebastian Bach. Desde então, o grupo veio definhando comercialmente e musicalmente, onde um incessante e bizarro entra e sai de vocalista cismava ser a ordem do dia.

Os ventos, finalmente, começaram a soprar a favor do grupo com a entrada do ótimo vocalista sueco Erik Grönwall, no ano passado. Erik foi o responsável pela ressuscitação do Skid Row e por transformar a performance do grupo no Summer Breeze Brasil uma das mais quentes e divertidas.

Embalada por temas novas e antigos como The Gang’s All Here, Time Bomb, Slave to the Grind, Monkey Business, In a Darkened Room e Youth Gone Wild, a apresentação provou aos fãs brasileiros que a banda só precisava de um grande vocalista para se desvencilhar do fantasma da presença de Bach e seguir em frente vislumbrando grandes conquistas.

Foto: MH ARTS

Com uma oratória e carisma impecáveis, o air-raid siren, Bruce Dickinson, falou sobre sua vida pessoal e profissional no Waves Stage. Então, histórias sobre o mercado de aviação e sua luta contra o câncer na garganta fisgaram atenção do público que prestigiaram a interessante palestra.

Além disso, o cantor deu uma dica simples aos fãs, mas de extremo valor: Contemple as muitas opções que a vida lhe oferece; não fique preso a uma coisa ou outra, a vida é plural. Como dito anteriormente, é simples e óbvio, mas é uma lição de profundo valor para a condução de uma vida mais leve e plena. Ah, apenas um adendo: Bruce deixou escapar que virá ao Brasil ainda neste ano, na próxima edição da Comic-Con, que ocorre no final do ano.

Apesar das engrenagens do festival estarem rodando, a tal altura do campeonato, com certa desventura, alguns pontos já se mostravam críticos e foram agravados com o decorrer da festa. Os banheiros químicos sempre são os vilões de eventos como este, e não foi diferente desta vez. Com pouca ou nenhuma supervisão, os banheiros se tornaram um ambiente insalubres e sujos em demasia; até mesmo para os padrões de eventos deste perfil, onde já é esperado um certo perrengue na infraestrutura.

A acessibilidade pareceu não ter sido a uma das preocupações da produção, pois pessoas com dificuldades de locomoção, por exemplo, enfrentaram um verdadeiro martírio para necessidades básicas como utilizar os banheiros e circulação pelo evento, já que uma grande passarela, que ligavam duas diferentes áreas do festival, desafiavam o condicionamento físico do público em geral; imagina para o público com mobilidade reduzida. Um pouco mais de respeito e carinho pelo próximo sanariam rapidamente tais questões.

Outro ponto crítico, além do salgadíssimo preço da entrada, fora o ingresso de acesso ao Summer Lounge, que era a área premium e abastada do festival, visto que demandava adquirir o ingresso do festival separadamente. Parece que a comunicação do festival fora falha neste quesito, pois muitas pessoas não entenderam a proposta e só compraram o ingresso do Summer Lounge, causando confusão na entrada do evento.

De volta às questões musicais, o Sepultura apresentou seu thrash metal no Ice Stage e fez o de sempre: Um show energético, onde os olhos são hipnoticamente voltados à performance do baterista Eloy Casagrande. Já o debutante nos palcos brasileiros fora o Lord of the Lost, que apresentou seu metal industrial com muita pompa, carisma e algumas oscilações no microfone de Chris Harms, mas nada que tirasse o brilho de Drag Me to Hell, Loreley e afins. Um retorno breve aos palcos daqui é mais do que certo e esperado.

Lamb of God nunca entrou num palco com má vontade ou para apresentar um concerto meia boca! No Summer Breeze Brasil não foi diferente, pois que Ruin, 512, Laid to Rest e Redneck fizeram o chão da Memorial da América Latina tremer. Lá no Ice Stage, Stone Temple Pilots provou que ainda tem lenha para queimar e segurou a bronca de ser uma das principais atrações do dia com repertório repleto de sons do quilate de Sin, Plush, Vasoline, Dead & Bloated, entre outras.

Foto: MH ARTS
Foto: MH ARTS

Perturbator, ainda que tenha angariado algum público, nada acrescentou ao festival e poderia ter cedido lugar a algum conjunto com mais milhagem musical e repertório mais caprichado. E por falar em caprichado, esse fora o teor do show apresentado pelo Accept. Ancorado em seu mais recente trabalho de estúdio, Too Mean To Die, e, obviamente, em clássicos como Restless and Wild, Midnight Mover, Princess of the Dawn, Fast as a Shark, Metal Heart e Balls to the Wall, o guitarrista Wolf Hoffmann mostrou que está feliz da vida com a atual encarnação da banda.

O cansaço já batia à porta, mas a maratona do dia ainda não tinha chegado ao fim, pois o Blind Guardian iria tomar de assalto o Hot Stage com um espetáculo cercado por uma performance impecável de Hansi Kürsch e companhia; além disso, serviu para tirar o atraso de uma ausência de sete anos em nossas terras. Além das indefectíveis Imaginations From the Other Side, Nightfall, Time Stands Still (At the Iron Hill), Lord of the Rings, Majesty, Valhalla e Mirror Mirror, o grupo alemão brindou o público com a execução na íntegra de Somewhere Far Beyond, de 1992. O espetáculo fora uma ode ao power metal e provou que o estilo ainda conserva um público cativo.

Apesar de ser das gélidas terras da Alemanha, o carisma de Hansi é quente e mostra o quão muitas bandas nacionais e internacionais precisam ralar para se equiparar ao patamar do Blind Guardian. O frontman prometeu que voltará muito em breve para o Brasil. Em se tratando de Kürsch, promessa feita é promessa cumprida.

O Summer Breeze Brasil estreou em alto estilo e com atrações memoráreis! Os erros primários de produção, que são perfeitamente solucionáveis, não macularam o imenso legado e prestigio que a marca ostenta em sua terra natal. Para se concretizar no calendário brasileiro, alguns aperfeiçoamentos serão necessários como uma harmonia às condições sociais e econômicas de nosso país e um zelo maior pelo público em sua infraestrutura. No geral, no entanto, o saldo fora positivo e esperamos por mais.

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